domingo, 14 de fevereiro de 2016

Um sono no céu

Já tinha me esquecido do quão dolorido era perder um animal, até que esse dia chegou, hoje a tarde. O céu não amanheceu escuro, nem a chuva caiu forte, mas nosso coração se escureceu e inundou-se de lágrimas quando percebemos que ele havia partido. Seu nome era Brutus, que por sinal lhe cabia muito bem. Ele era meio bruto, não abria a cara, nem o jogo. Aquele semblante sério escondia um coração de ouro. Um cão cuidadoso, protetor, ciumento e amigo. Mais que amigo.  Humano.
     Não era um desses cachorros de raça. Era mais um desses cachorros que a gente se apaixona quando o vizinho, sem condições de criar, lhe mostra aflito, depois do nascimento de mais cinco. E foi assim que ele chegou. Após a última perda havíamos prometido para nós mesmos que nunca mais teríamos nenhum cão. "É melhor não ter, do que perder." Mas ao olhar para aquele "serzinho" na caixinha de papelão, não tinha como não adotá-lo. Sabíamos que era melhor sentir um dia a dor da perda, do que não tê-lo.
     A casa era um apartamento então seu tempo dentro de casa foi curto, mas nem por isso deixou de ser marcante. Da janela da cozinha fazíamos a vigília. Ele nos vigiava e nós fazíamos o mesmo. O protegíamos e ele era responsável pela nossa proteção. Quando ficou velhinho, foi presenteado com uma irmã. Mais uma vira latinha. Ela veio para dividir com ele muitas aventuras. Na verdade ela veio para lhe tirar a paz, mas também lhe mostrou pela primeira vez como a vida era gigante e linda fora dos portões de casa. 
     Foram muitas fugidinhas, muitas aventuras, noites pela rua e consequentemente muita insônia a todos nós. Mas no fim, lá estava ele de volta, sendo trazido pela sua irmã mais nova. E sua cara de arrependido, se desculpando pela demora. E hoje a gente sentiu saudades dessa cara, que agora não mais se desculpará apesar do tempo que ficará fora. Nosso olhar inevitavelmente continuará na porta a espera da sua volta, continuará na sacada da varanda procurando seu retorno, continuará na janela da cozinha esperando seus latidos por comida, continuará ao lado da Nina, sua fiel companheira, que agora está só.   
     Aquilo que parecia apenas um resfriado foi na verdade a sua partida. Pela sua idade ficamos apreensivo com os sinais da gripe, mas por mais que a gente espere, nunca queremos o fim. Nunca acreditamos que chegou a hora. O que nos conforta é saber que você não sofreu e que sua partida foi tranquila. Para você e para nós parecia apenas mais um cochilo, do qual infelizmente você não acordou. Chegou o dia de dormir no céu. Hoje você se afastou de nós, mas temos a certeza de que você se aproximou de Deus. Vá em paz. Vá com Deus.

Mayra Coimbra 


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